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A morte de JK

O artigo “A morte de JK” é de autoria do advogado Paulo Castelo Branco e foi escrito com exclusividade para o site Direito Global:

A decisão da Ordem dos Advogados de Minas Gerais de requerer novas investigações sobre a morte do ex-presidente Juscelino Kubitscheck renova a esperança de que, finalmente, seja esclarecida a implacável perseguição ao construtor de Brasília.

Juscelino foi, sem dúvida, o presidente que transformou o Brasil em uma nação moderna e desenvolvida. O golpe que o afastou da possibilidade de retornar à presidência da República foi um dos atos mais prejudiciais à democracia e ao povo.

Não há dúvidas de que o governo de João Goulart estava minado pela sua leniência no controle dos que desejavam transformar o país numa república socialista. No entanto, se os golpistas tivessem cumprido com o compromisso de devolver o poder aos civis, com certeza JK estaria entre os mais importantes dos candidatos à presidência.

Juscelino, à época da derrubada de Jango, mesmo contrário ao uso da força, aliou-se a adesão popular ao movimento revolucionário que seguia os rumos de outros países da America Latina e, na eleição indireta para escolha do presidente provisório, apoiou o candidato imposto pelos militares.

Estabelecida a nova ordem com a edição dos atos institucionais, a lei da mordaça imperou e muitos parlamentares tiveram seus mandatos cassados, apesar de ter sido prometido pelo primeiro mandatário que passaria a presidência ao escolhido pelo povo em eleição livre e democrática. Não foi o que aconteceu. Juscelino não pode ser candidato e acabou sendo cassado e exilou-se na França.

Na Europa, a vida do ex-presidente foi dura e solitária. Alguns amigos contribuíram para que JK levasse uma vida digna. Num modesto apartamento na capital francesa, Juscelino tinha esperanças de voltar ao Brasil e retomar a vida pública. Quando voltou do exílio, ele foi submetido a duros e desrespeitosos inquéritos militares que lhe minaram as forças.

A influência e o carisma de Juscelino fortaleceram a admiração que se mantinha no meio da população, assustava não só os governantes da hora, como, também, ditadores de países vizinhos que exigiam e tramavam a morte de políticos. Documentos encontrados em investigações posteriores às ditaduras possuem indícios contundentes da intenção de eliminar opositores dos regimes. As ações foram comprovadas com a morte de vários políticos latinos americanos.

Aqui no Brasil, as sucessivas mortes de João Goulart, Carlos Lacerda e Juscelino levaram os pesquisadores à conclusão de que a Operação Condor poderia ter preparado uma cilada para matar o ex-presidente.

Quando fui convidado por Serafim Jardim, presidente da Casa de JK em Diamantina, para propor a reabertura das investigações sobre a morte do ex-presidente, aceitei a missão ao ouvir de Sarah Kubitscheck as dúvidas que guardava sobre o possível atentado a Juscelino.

Fui à cidade de Rezende, no Estado do Rio de Janeiro, e, após examinar atentamente o processo que apurou o chamado “acidente”, concluí que muitos fatos eram nebulosos e mereciam ser novamente investigados. Conseguimos o apoio do presidente Fernando Henrique Cardoso, mas não do Ministro da Justiça Nelson Jobim que, mesmo sem examinar os autos se manifestou contrariamente à reabertura do caso.

O Ministério Público, recebendo o nosso pedido, concordou com as alegações e requereu ao Juízo do Estado do Rio de Janeiro a reabertura das investigações.

Durante os trabalhos, localizamos o veículo no qual viajava JK, nos fundos de uma delegacia de polícia. Serafim Jardim contratou um perito criminal que apurou vários indícios de crime. Pedida a exumação do corpo do motorista que conduzia o veículo, foi constatada a existência de um pedaço de metal que, segundo o perito, poderia ser de um projétil.

Infelizmente o prazo prescricional interrompeu a investigação, e o processo foi arquivado definitivamente.

Agora, com a criação da Comissão da Verdade, é possível que pessoas conhecedoras de fatos jamais expostos, e interessadas na elucidação do caso, se apresentem com informações nunca oferecidas à apreciação do Poder Judiciário.

Desta forma, sem a possibilidade de punição a supostos autores do possível atentado, o Brasil poderá conhecer os segredos que levaram à morte o ex-presidente. É certo que ídolos como JK nunca morrem, pois vivem todos os dias na memória do povo brasileiro, como chama que ilumina os caminhos da democracia, da justiça e do progresso.